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“Ando muito neurastenico e nervoso creio que são achaques da idade."
Carta manuscrita de Emiliano Di Cavalcanti para Gildo.
Uma folha.
Em português.
14 cm x 20 cm.
São Paulo 23 de Julho de 1941.
Estado perfeito de conservação.
Peça única.
Transcrição
Papel timbrado a azul. Dentro de um rectângulo com a imagem de um avião bimotor as palavras: “POR AVIÃO VIA VASP”
São Paulo 23 de Julho de 1941
Avenida Ypiranga 480 Apartado 906
Meu caro Gildo
Ante hontem lhe telefonei respondendo assim / com urgência a sua carta. Ja tratei de mandar / buscar os meus trecos como dizia minha avo Mãe / VELHA, mãe de um Pae que era sertaneja do nordes- / te. Queria que voce me dissesse quanto lhe custou / o possivel encaixotamento ou outras despesas suple- / mentares. Não é preciso acrescentar que lhe sou gratissi- / mo e desejaria que você viesse passar uns tres / dias comigo aqui em São Paulo. / Ando muito neurastenico e nervoso creio que / são achaques da idade. E voce como vae? Escreva- / me sempre que puder. / Um grande abraço do seu
Di Cavalcanti (assinado) Lembrança a Ignez
Di Cavalcanti (1897 - 1976) nasceu no Rio de Janeiro em 1897, porém as raízes nordestinas de sua família sempre estiveram presentes em seu trabalho. Contudo, sua vida artística deslancharia com sua mudança a São Paulo, onde idealizou e organizou a Semana da Arte Moderna de 1922, no Teatro Municipal da capital paulista. Esse acontecimento inaugurou o Modernismo no Brasil, movimento que tornou-se uma referência cultural do século XX.
Di Cavalcanti aproveitou da liberdade artística dessa nova forma de pensar para construir, acima de tudo, uma arte brasileira. Viajou por vários países da Europa, teve uma forte influência do expressionismo alemão e do cubismo, não obstante, com essas referências retratava temas característicos brasileiros, como os carnavais, os operários, as favelas, e até mesmo a miscigenação de raças típicas do Brasil, que até então era escondida atrás de uma tentativa de europeização do país.
Sem dúvidas, Di Cavalcanti é uma figura inspiradora, porém ele também viveu seus momentos difíceis. Foi perseguido e preso por suas convicções políticas em um Brasil convulsionado pelo avanço totalitarista do Estado Novo de Getúlio Vargas. Libertado, fugiu para Paris, de onde teve que escapar uma vez mais devido à Segunda Guerra Mundial. Todos esses acontecimentos, muito além de fatos históricos, tiveram um impacto profundo no espírito do artista, que sofria com os incidentes à sua volta.
No ano de 1941, Cavalcanti escreveu essa carta dedicada a seu amigo Gildo na qual revela-se muito neurastênico e nervoso, o que ele mesmo acreditava que fossem “achaques da idade”. É envolvente e intrigante descobrir, por meio dos escritos dessas grandes personalidades, confissões de sua intimidade que demonstram que eles são mais frágeis e humanos que registram os livros de História.