Em 1954, Vinicius de Moraes compartilha com a filha a saudade e suas reflexões sobre a carreira em Paris.
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Carta de Vinicius de Moraes para sua primeira filha, Susana de Moraes.
- Uma folha, duas páginas.
- Em português.
- 20.9 cm x 27.1 cm.
- Paris, 25 de novembro de 1954.
- Excelente estado.
- Peça única.
Trechos
(...) Acho uma graça você me dizer que está perigando em matemática. Igualzinha a seu pai, que ficava diante de um cálculo complicado como uma vaca diante de uma catedral.
(...) Fiquei besta foi com a sua altura. Não vá crescer demais e passar de 1m70, que é a altura do seu “velho”. Lenão depois, quando você já começar a ir a boites com seu pai, eu vou ter de pôr aquele salto ridículo que o Jorginho Guiné põe quando sai com a mulher dele.
(...) Em reve publicarei um livro novo de poemas meus, traduzidos para o francês, porque as “Cinco Elegias” tiveram bastante saída.
(...) Mas nada disso, filhinha, vale o fato de seu pai estar longe de vocês. Se não fosse já tão tarde na vida, e eu precisasse da carreira para ajudar vocês e a mim mesmo, seu pai meteria a cara em outra coisa aí no Brasil, cinema, ou outra coisa qualquer, porque, à medida que o tempo passa, vai ficando cada vez mais difícil viver longe dos filhinhos.
Em 1954, Vinicius de Moraes estava vivendo em Paris, onde trabalhava na embaixada brasileira. Esse período de sua vida foi marcante, pois ele se encontrava em uma fase de transição artística. Após publicar obras significativas como Cinco Elegias e Poemas, Sonetos e Baladas, ele lançou sua Antologia Poética e a peça Orfeu da Conceição, que foi premiada. Durante sua estadia na capital francesa, Vinicius também começou a se envolver com o jovem pianista Tom Jobim, o que mais tarde resultaria em uma das colaborações mais icônicas da música brasileira. Apesar das responsabilidades diplomáticas, sua paixão pela poesia e pela música continuava a florescer.
A relação de Vinicius com sua primeira filha, Susana, era marcada por uma profunda saudade e carinho, uma admiração mútua que perdurou até a morte de Vinicius. Mais tarde, Susana frequentemente refletiu sobre como a obra do pai influenciou sua vida, a música, a literatura e o Brasil. Ela provavelmente era a pessoa que melhor entendia a complexidade do artista, tanto em suas conquistas quanto em suas vulnerabilidades.
Essa carta é excepcional por ser manuscrita, extensa, em perfeito estado e, sobretudo, por possuir um conteúdo muito pessoal e profundo. Basta lê-la para entrar no mundo de Vinicius, esse gênio brasileiro reconhecido mundialmente não só como o coautor — com Tom Jobim — de “Garota de Ipanema”, mas, de forma mais ampla, como um dos inventores da Bossa Nova e grande autor de teatro. A assinatura “Darling” no final, apelido que Susana dava a Vinicius, é a cereja do bolo.